PLATAFORMA BRASILEIRA DE GAYS, LÉSBICAS,TRAVESTIS,
TRANSEXUAIS E BISSEXUAIS PARA AS ELEIÇÕES DE 2002
 
INTRODUÇÃO
 

Gays, lésbicas, travestis, transexuais e bissexuais (GLBTT) do Brasil encontram- se hoje, como toda a população brasileira, na expectativa do processo eleitoral que se inicia. Serão milhões de pessoas, participando de um pleito que deverá eleger Deputados Estaduais e Federais, Senadores, Governadores e Presidente da República. Se não bastasse ser a primeira eleição do novo milênio em nosso país, e na qual serão definidos os ocupantes dos postos mais importantes de nossa cultura política, será também a primeira eleição depois de mais de 500 anos de nossa história a partir da colonização européia, num momento emblemático para se voltar
nossos olhos ao passado,pensando na construção de um futuro melhor para todas e todos que habitam estas terras, a partir do enfrentamento corajoso dos dilemas de nosso presente, onde oscilações da moeda norte americana provocam verdadeiras convulsões em nossa economia, desafiando a idéia de um projeto de nação para o Brasil.

Esta é a questão que está posta para o movimento de GLTTBs brasileiros nesta eleição: ao mesmo tempo em que pensamos nas propostas que são mais centrais para a superação do preconceito, da discriminação e da homofobia, somos obrigados a fazer uma reflexão sobre o modelo de sociedade que queremos, se nos damos por satisfeitos com a enorme desigualdade social e econômica que flagela o Brasil, ou se nos propomos a ajudar a erigir uma nação onde amplas parcelas que são atualmente excluídas do acesso a qualquer direito básico, passem a ter um mínimo de dignidade como seres humanos. Pretendemos através desta plataforma deixar bastante claro que não alcançaremos uma sociedade efetivamente democrática se não superarmos, num mesmo processo político, tanto nossa herança de exploração econômica de uma minoria dominante das Capitanias Hereditárias até nossos dias - sobre uma grande massa de espoliados, quanto as marcas de uma construída à base da opressão machista, racista, de geração e especialmente para nós decorrente da orientação sexual.

Não somos pessimistas, e acreditamos num futuro promissor para o Brasil, onde as idéias de direitos humanos e de cidadania deixem de ser meras proclamações de intenções e se tornem realidade concreta e efetiva. Mas este futuro depende muito dos rumos que adotarmos agora, e é com esta preocupação que chamamos a todos e todas, gays, lésbicas, travestis, transexuais e bissexuais, bem como aquelas e aqueles que apóiam nossa causa, a pensarem bastante sobre o exercício do voto nestas eleições.


A LUTA DOS HOMOSSEXUAIS NO BRASIL

Considerando-se que se costuma fixar o final dos anos setenta do Século XX como o início do movimento de GLTTBs em nosso País, temos um período de quase um quarto de século de organização e luta de nosso segmento social. Num primeiro momento, coincidindo com a mobilização da sociedade civil pelo fim da ditadura militar, o centro de nossos objetivos era a conquista de liberdades políticas, paralelamente ao questionamento ao preconceito e à discriminação.

O advento da epidemia da AIDS, erroneamente apontada no início como uma “doença de gays”, ao mesmo tempo em que agregou um novo elemento de preconceito e de segregação contra os homossexuais, impôs ao movimento um avanço na construção de laços de solidariedade e na organização dos grupos organizados de GLTTBs. Essa foi a principal marca dos anos 80, não se podendo esquecer da mobilização dos homossexuais no período da Constituinte, ainda que sem um êxito maior, e da importante conquista que foi a deliberação do Conselho Federal de Medicina excluindo a homossexualidade da classificação de patologias, em 1985.

Mas foram os anos 90 que marcaram o grande salto do movimento de GLTTBs brasileiros. O crescimento vertiginoso de organizações voltadas à luta pelos direitos e pela cidadania homossexual, que hoje já ultrapassam a marca de 100 (cem) grupos espalhados por quase todo o território nacional, a conquista de legislações anti discriminatórias em nível municipal (mais de uma dezena, em capitais e cidades importantes) e no Distrito Federal, Estados de Alagoas, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, a implementação de políticas públicas em favor dos GLTTBs (tais como o reconhecimento do dia 28 de junho Dia do Orgulho Homossexual como uma data oficial em diversos municípios, a extensão de direitos previdenciários aos parceiros homossexuais seja para os trabalhadores do setor privado a partir de ação civil pública do Ministério Público Federal/RS seja para algumas parcelas dos servidores municipais - caso de Pelotas, RS, Recife, PE - e estaduais - no Estado do RJ, embora esteja sub júdice), são evidências de que a ação dos homossexuais em defesa de seus direitos tem produzido resultados positivos.

As lésbicas, erguendo juntamente com a questão da discriminação pela orientação sexual a questão da opressão de gênero, começam a organizar-se em espaços específicos, acontecendo os SENALEs (Seminários Nacionais de Lésbicas), cuja IV edição aconteceu em agosto de 2001, em Fortaleza, CE, e consagrando o dia 29 de agosto como o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica. As travestis têm igualmente um considerável avanço em sua organização específica, com a realização dos ENTLAIDS (Encontros Nacionais de Travestis e Liberados que trabalham com a AIDS), culminando com a criação da ANTRA - Articulação Nacional de Transgêneros. Em setembro de 1997, conseguiu-se um grande avanço, com a Resolução n. 1482/97 do Conselho Federal de Medicina-CFM, que reconheceu a imperiosa necessidade das cirurgias de adequação genital em pessoas com disforias de gênero (transexuais), como único meio de tratamento e adequação devido para essas pessoas, do ponto de vista médico. Esse fato tem propiciado o desenvolvimento de tecnologia brasileira nessa área, tanto na avaliação e diagnóstico das disforias como na técnica cirúrgica para desenvolvimento de cirurgias de redesignação. Esse avanço tem começado a gerar precedentes favoráveis na aceitação da redesignação civil em transexuais, gerando jurisprudência inédita nessa área, no Brasil.

Temos muito a nos orgulhar nestas mais de duas décadas de movimento, mas sabemos que ainda é grave a situação de homofobia em nosso País. E é para darmos passos mais significativos nesse avanço que consideramos irreversível, que debatemos este conjunto de propostas ora apresentadas não apenas às candidaturas a todos os cargos eletivos, mas ao povo brasileiro, destinatário maior de nosso esforço pela construção de uma Nação justa e solidária, sem opressões e discriminações de qualquer espécie.


POLÍTICAS DE COMBATE À DISCRIMINAÇÃO DE GLTTBs


Um dos planos de atuação dos poderes públicos se refere ao compromisso com a implantação, em todos as esferas da República, de legislações penais, civis, administrativas e trabalhistas que coíbam severamente a discriminação em razão da orientação sexual. Mas além de instrumentos normativos e legais, são necessários mecanismos que permitam a tais legislações alcançar um grau positivo de eficácia.


Neste sentido, propomos:

I. Apresentação de Projetos de Lei que proíbam e punam qualquer tipo de discriminação baseada na orientação sexual em estabelecimentos comerciais, no mercado de trabalho, nos meios de comunicação, ambiente familiar e na escola;

II. Proibição de participação em licitações publicas de pessoas jurídicas e físicas que tenham discriminado homossexuais;

III. Apoio à apuração e punição efetiva e rigorosa dos crimes cometidos contra Gays, lésbicas, travestis, transexuais e demais setores discriminados.

IV.Criação, revitalização e fortalecimento de órgãos públicos e conselhos que trabalham com binômio cidadania e direitos humanos dos GLTTBs.

V. Mudança nas escolas de formação de policiais no sentido de respeitar as diferenças sexuais, assumindo um papel educativo e protagonista com o segmento sexual.

VI. Criação de serviços de Disque Cidadania e Defesa Homossexual e da delegacia especial de atendimento e combate à violência contra homossexuais.

VII. Engajamento na luta pela aprovação da Emenda Constitucional, em tramitação na Câmara Federal, que proíbe a discriminação em razão da orientação sexual.

VIII. Criminalização da discriminação em razão da orientação sexual, estabelecendo penalidades no Código Penal Brasileiro.

IX. Revogação do artigo do Código Penal Militar que tipifica como crime a pederastia.

X. Descriminalização dos atos cirúrgicos e terapêuticos que visam à integração existencial, social e civil das pessoas disfóricas de gênero adequadas por cirurgias de transgenitalização e adequação hormonal.

XI. Revisão da legislação de Registros Civis, permitindo, como nos casos de intersexo e hermafroditismo, um novo assentamento civil nos casos de pessoas disfóricas de género adequadas e transgenitalizadas, com a devida comprovação cirúrgica e terapêutica da necessidade médica e sexológica da adequação, tudo se passando em segredo de justiça, para a preservação da identidade da vítima.


Medidas de afirmação da igualdade

Além das proposições voltadas ao combate à homofobia e à discriminação, com caráter mais pedagógico do que punitivo, consideramos fundamental a adoção de propostas que incidam na superação da desigualdade entre os heterossexuais e na ação de cunho educacional, na tentativa de que as novas gerações recebam uma carga menor de preconceito e de intolerância.


Sendo assim, defendemos:

I. Garantia aos companheiros (as) de funcionários públicos Federais e Estaduais homossexuais de todos os benefícios previdenciários já oferecidos aos companheiros (as) de funcionários públicos Federais e Estaduais heterossexuais pela legislação previdenciária.

II. Apoio à luta pela aprovação do Projeto de Lei do Contrato de União Civil Entre Pessoas do Mesmo Sexo.

III. Incorporação e aplicação de programas de educação especializado no ensino de 1º e 2º graus, respeitando a livre orientação sexual.

IV. Incentivo a eventos socioculturais de temática homossexual, dando apoio e tomando visíveis as datas comemorativas das minorias sexuais buscando a visibilidade.

V. Criação de programas específicos de saúde que atendam à demanda em relação ao segmento homossexual como:

a. Atendimento integral aos profissionais do sexo;

b. Atendimento que contemple as especifícidades de travestis e transexuais;

c. Capacitação e treinamento permanentes dos profissionais da área de saúde para combater o preconceito e a discriminação no atendimento de gays, lésbicas, travestis, transexuais e profissionais do sexo, evitando o constrangimento e a discriminação do doador de sangue que mantenha relações sexuais com pessoas do mesmo sexo;

d. Implementar programas de prevenção das Doenças Sexuais Transmissíveis e AIDS/HIV junto ao segmento homossexual;

e. Atendimento psicológico destinado aos familiares de gays, travestis, lésbicas e transgêneros de forma a serem esclarecidos sobre a questão da homossexualidade como orientação e não como desvio;

f. Garantir acesso gratuito e continuado pela Rede Pública de Saúde da realização de cirurgia para adequação de sexo para os/as transexuais;

g. Implementação de políticas públicas que gerem empregos e renda para os homossexuais;

h. Constituição de um Comitê Assessor composto por lideranças homossexuais e técnicos no âmbito do Ministério da Justiça para orientar e propor a implementação de políticas públicas de afirmação da cidadania homossexual;

i. Implementação pelo Governo Federal das metas propostas no Programa Nacional de Direitos Humanos em prol da cidadania homossexual.



Conclusão

Este conjunto de propostas não encerra todas as nossas preocupações no tocante aos compromissos dos futuros administradores e legisladores de nosso País, mas é o saldo de uma discussão amadurecida por estes quase 25 anos de luta, e a postura das candidaturas em todos os níveis frente a elas certamente influenciará significativa parcela da sociedade brasileira, não apenas de gays, lésbicas, travestis, transexuais e bissexuais, mas de todas e todos que acreditam que sem a superação da homofobia e da discriminação jamais alcançaremos uma efetiva democracia no Brasil.



ASSINAM ESTA PLATAFORMA (em ordem alfabética)

1. Adé Fidan/Casa de Vivência “Saara Santana” - Londrina - PR

2. AFAGHO Apoio a Familiares e Grupos Homossexuais Campinas - SP

3. ANTRA Articulação Nacional de Transgêneros

4. Associação Amazonense de Gays, Lésbicas e Travestis AAGLT - Manaus - AM

5. Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis ABGLT

6. Associação Garotos da Noite Profissionais do Sexo Masculino - Manaus - AM

7. Associação Goiana de Gays, Lésbicas e Travestis AGLT - Goiânia - GO

8. Associação Ipê Rosa GLSTB - Goiânia - GO

9. Associação das Lésbicas de Minas Gerais (ALEM) - Belo Horizonte - MG

10. Associação de Luta Pela Vida - Boa Vista - RR

11. Associação da Parada do Orgulho de Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros de Brasília - DF

12. Associação da Parada do Orgulho de Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros de São Paulo - SP

13. Associação Princesa Conscientização e Emancipação Homossexual - Manacapurú - AM

14. Associação Sul-Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis ASBRAGELT - Curitiba - PR

15. Associação das Travestis do Amazonas ATRAAM - Manaus - AM

16. Associação das Travestis do Mato Grosso do Sul - Campo Grande

17. Associação de Travestis e Transexuais de Salvador ATRAS - BA

18. Atitude - Instituto Atitude - Direito e Cidadania para Homossexuais - Brasília - DF

19. Atobá Movimento de Afirmação Homossexual - Rio de Janeiro - RJ

20. Cellos/MG- Centro de Luta pela Livre Orientação sexual - Belo Horizonte - MG

21. Clube Rainbow de Serviços - Belo Horizonte - MG

22. Coletivo de Feministas Lésbicas - São Paulo - SP

23. Coletivo de Lésbicas do Rio de Janeiro COLERJ - RJ

24. CORSA Cidadania, Orgulho, Respeito, Solidariedade e Amor - São Paulo - SP

25. E-jovem.com Grupo de Adolescentes Homossexuais - Campinas - SP

26. Estruturação Grupo Homossexual de Brasília - DF

27. G Magazine - São Paulo - SP

28. GDC (Grupo Diversidades de Conscientização GLBT)

29. Gendercare.com - Gender Therapy Oníine

30. GLOS (Grupo de Livre Orientação Sexual) - Caxias do Sul-RS

31. GrupoAMHOR - Recife - PE

32. Grupo Arco-Íris de Conscientização Homossexual - Rio de Janeiro - RJ

33. Grupo Brasileiro de Disfóricos de Género GBDG

34. Grupo Desobedeça GLBT - Porto Alegre - RS

35. Grupo Dignidade - Curitiba - PR

36. Grupo Esperança Construindo a Cidadania das Travestis - Curitiba - PR

37. Grupo Felipa de Sousa - Rio de Janeiro - RJ

38. Grupo Gay de Alagoas - Maceió

39. Grupo Gay da Bahia - Salvador

40. Grupo Gay de Camaçari - BA

41. Grupo Lésbico da Bahia - Salvador

42. Grupo Hábeas Corpus Potiguar - Natal - RN

43. Grupo Leões do Norte - Recife - PE

44. Grupo Matizes - Teresina - PI

45. Grupo de Resistência Asa Branca - Fortaleza - CE

46. Grupo Satyricon - Recife - PE

47. Identidade Grupo de Ação Pela Cidadania Homossexual - Campinas - SP

48. Igualdade Associação das Travestis e Transexuais do Estado do Rio

Grande do Sul - Porto Alegre

49. ILGLAW mtemational Lesbian and Gay Law Association/Brasil

50. Instituto Paranaense 28 de Junho - Curitiba PR

51. Movimento Contra a Homofobia - Uberaba - MG

52. Movimento Gay de Minas - Juiz de Fora - MG

53. Movimento pelo Espírito Lilás MEL - João Pessoa - PB

54. Movimento Homossexual de Belém - PA

55. Movimento Lésbico de Campinas MO.LE.CA. - Campinas - SP

56. Provida - Maceió - AL

57. Quimbanda Dudu Grupo Gay Negro da Bahia - Salvador

58. Rede de Informação Um Outro Olhar - São Paulo - SP

59. Site Bybas.cjb.net - Campinas - SP

60. Site Namoro Gay Brasil - São Paulo - SP

61. SiteGLSPlanet.com

62. Site GLSSITE.Net

63. Sub-Comissão de Orientação Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil - SP

64. Transgender Brasil- Associação Brasileira de Portadores de Neurodiscordância de Gênero

 
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orientação sexual
 Relação de municípios e estados com leis sobre discriminação
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