Gays, lésbicas, travestis, transexuais
e bissexuais (GLBTT) do Brasil encontram- se hoje, como
toda a população brasileira, na expectativa
do processo eleitoral que se inicia. Serão milhões
de pessoas, participando de um pleito que deverá
eleger Deputados Estaduais e Federais, Senadores, Governadores
e Presidente da República. Se não bastasse
ser a primeira eleição do novo milênio
em nosso país, e na qual serão definidos
os ocupantes dos postos mais importantes de nossa cultura
política, será também a primeira
eleição depois de mais de 500 anos de
nossa história a partir da colonização
européia, num momento emblemático para
se voltar
nossos olhos ao passado,pensando na construção
de um futuro melhor para todas e todos que habitam estas
terras, a partir do enfrentamento corajoso dos dilemas
de nosso presente, onde oscilações da
moeda norte americana provocam verdadeiras convulsões
em nossa economia, desafiando a idéia de um projeto
de nação para o Brasil.
Esta é a questão que está posta
para o movimento de GLTTBs brasileiros nesta eleição:
ao mesmo tempo em que pensamos nas propostas que são
mais centrais para a superação do preconceito,
da discriminação e da homofobia, somos
obrigados a fazer uma reflexão sobre o modelo
de sociedade que queremos, se nos damos por satisfeitos
com a enorme desigualdade social e econômica que
flagela o Brasil, ou se nos propomos a ajudar a erigir
uma nação onde amplas parcelas que são
atualmente excluídas do acesso a qualquer direito
básico, passem a ter um mínimo de dignidade
como seres humanos. Pretendemos através desta
plataforma deixar bastante claro que não alcançaremos
uma sociedade efetivamente democrática se não
superarmos, num mesmo processo político, tanto
nossa herança de exploração econômica
de uma minoria dominante das Capitanias Hereditárias
até nossos dias - sobre uma grande massa de espoliados,
quanto as marcas de uma construída à base
da opressão machista, racista, de geração
e especialmente para nós decorrente da orientação
sexual.
Não somos pessimistas, e acreditamos num futuro
promissor para o Brasil, onde as idéias de direitos
humanos e de cidadania deixem de ser meras proclamações
de intenções e se tornem realidade concreta
e efetiva. Mas este futuro depende muito dos rumos que
adotarmos agora, e é com esta preocupação
que chamamos a todos e todas, gays, lésbicas,
travestis, transexuais e bissexuais, bem como aquelas
e aqueles que apóiam nossa causa, a pensarem
bastante sobre o exercício do voto nestas eleições.
A LUTA DOS HOMOSSEXUAIS
NO BRASIL
Considerando-se que se costuma fixar o final dos anos
setenta do Século XX como o início do
movimento de GLTTBs em nosso País, temos um período
de quase um quarto de século de organização
e luta de nosso segmento social. Num primeiro momento,
coincidindo com a mobilização da sociedade
civil pelo fim da ditadura militar, o centro de nossos
objetivos era a conquista de liberdades políticas,
paralelamente ao questionamento ao preconceito e à
discriminação.
O advento da epidemia da AIDS, erroneamente apontada
no início como uma “doença de gays”,
ao mesmo tempo em que agregou um novo elemento de preconceito
e de segregação contra os homossexuais,
impôs ao movimento um avanço na construção
de laços de solidariedade e na organização
dos grupos organizados de GLTTBs. Essa foi a principal
marca dos anos 80, não se podendo esquecer da
mobilização dos homossexuais no período
da Constituinte, ainda que sem um êxito maior,
e da importante conquista que foi a deliberação
do Conselho Federal de Medicina excluindo a homossexualidade
da classificação de patologias, em 1985.
Mas foram os anos 90 que marcaram o grande salto do
movimento de GLTTBs brasileiros. O crescimento vertiginoso
de organizações voltadas à luta
pelos direitos e pela cidadania homossexual, que hoje
já ultrapassam a marca de 100 (cem) grupos espalhados
por quase todo o território nacional, a conquista
de legislações anti discriminatórias
em nível municipal (mais de uma dezena, em capitais
e cidades importantes) e no Distrito Federal, Estados
de Alagoas, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas
Gerais, a implementação de políticas
públicas em favor dos GLTTBs (tais como o reconhecimento
do dia 28 de junho Dia do Orgulho Homossexual como uma
data oficial em diversos municípios, a extensão
de direitos previdenciários aos parceiros homossexuais
seja para os trabalhadores do setor privado a partir
de ação civil pública do Ministério
Público Federal/RS seja para algumas parcelas
dos servidores municipais - caso de Pelotas, RS, Recife,
PE - e estaduais - no Estado do RJ, embora esteja sub
júdice), são evidências de que a
ação dos homossexuais em defesa de seus
direitos tem produzido resultados positivos.
As lésbicas, erguendo juntamente com a questão
da discriminação pela orientação
sexual a questão da opressão de gênero,
começam a organizar-se em espaços específicos,
acontecendo os SENALEs (Seminários Nacionais
de Lésbicas), cuja IV edição aconteceu
em agosto de 2001, em Fortaleza, CE, e consagrando o
dia 29 de agosto como o Dia Nacional da Visibilidade
Lésbica. As travestis têm igualmente um
considerável avanço em sua organização
específica, com a realização dos
ENTLAIDS (Encontros Nacionais de Travestis e Liberados
que trabalham com a AIDS), culminando com a criação
da ANTRA - Articulação Nacional de Transgêneros.
Em setembro de 1997, conseguiu-se um grande avanço,
com a Resolução n. 1482/97 do Conselho
Federal de Medicina-CFM, que reconheceu a imperiosa
necessidade das cirurgias de adequação
genital em pessoas com disforias de gênero (transexuais),
como único meio de tratamento e adequação
devido para essas pessoas, do ponto de vista médico.
Esse fato tem propiciado o desenvolvimento de tecnologia
brasileira nessa área, tanto na avaliação
e diagnóstico das disforias como na técnica
cirúrgica para desenvolvimento de cirurgias de
redesignação. Esse avanço tem começado
a gerar precedentes favoráveis na aceitação
da redesignação civil em transexuais,
gerando jurisprudência inédita nessa área,
no Brasil.
Temos muito a nos orgulhar nestas mais de duas décadas
de movimento, mas sabemos que ainda é grave a
situação de homofobia em nosso País.
E é para darmos passos mais significativos nesse
avanço que consideramos irreversível,
que debatemos este conjunto de propostas ora apresentadas
não apenas às candidaturas a todos os
cargos eletivos, mas ao povo brasileiro, destinatário
maior de nosso esforço pela construção
de uma Nação justa e solidária,
sem opressões e discriminações
de qualquer espécie.
POLÍTICAS DE COMBATE À DISCRIMINAÇÃO
DE GLTTBs
Um dos planos de atuação dos poderes públicos
se refere ao compromisso com a implantação,
em todos as esferas da República, de legislações
penais, civis, administrativas e trabalhistas que coíbam
severamente a discriminação em razão
da orientação sexual. Mas além
de instrumentos normativos e legais, são necessários
mecanismos que permitam a tais legislações
alcançar um grau positivo de eficácia.
Neste sentido, propomos:
I. Apresentação de Projetos de Lei que
proíbam e punam qualquer tipo de discriminação
baseada na orientação sexual em estabelecimentos
comerciais, no mercado de trabalho, nos meios de comunicação,
ambiente familiar e na escola;
II. Proibição de participação
em licitações publicas de pessoas jurídicas
e físicas que tenham discriminado homossexuais;
III. Apoio à apuração e punição
efetiva e rigorosa dos crimes cometidos contra Gays,
lésbicas, travestis, transexuais e demais setores
discriminados.
IV.Criação, revitalização
e fortalecimento de órgãos públicos
e conselhos que trabalham com binômio cidadania
e direitos humanos dos GLTTBs.
V. Mudança nas escolas de formação
de policiais no sentido de respeitar as diferenças
sexuais, assumindo um papel educativo e protagonista
com o segmento sexual.
VI. Criação de serviços de Disque
Cidadania e Defesa Homossexual e da delegacia especial
de atendimento e combate à violência contra
homossexuais.
VII. Engajamento na luta pela aprovação
da Emenda Constitucional, em tramitação
na Câmara Federal, que proíbe a discriminação
em razão da orientação sexual.
VIII. Criminalização da discriminação
em razão da orientação sexual,
estabelecendo penalidades no Código Penal Brasileiro.
IX. Revogação do artigo do Código
Penal Militar que tipifica como crime a pederastia.
X. Descriminalização dos atos cirúrgicos
e terapêuticos que visam à integração
existencial, social e civil das pessoas disfóricas
de gênero adequadas por cirurgias de transgenitalização
e adequação hormonal.
XI. Revisão da legislação de Registros
Civis, permitindo, como nos casos de intersexo e hermafroditismo,
um novo assentamento civil nos casos de pessoas disfóricas
de género adequadas e transgenitalizadas, com
a devida comprovação cirúrgica
e terapêutica da necessidade médica e sexológica
da adequação, tudo se passando em segredo
de justiça, para a preservação
da identidade da vítima.
Medidas de afirmação
da igualdade
Além das proposições voltadas ao
combate à homofobia e à discriminação,
com caráter mais pedagógico do que punitivo,
consideramos fundamental a adoção de propostas
que incidam na superação da desigualdade
entre os heterossexuais e na ação de cunho
educacional, na tentativa de que as novas gerações
recebam uma carga menor de preconceito e de intolerância.
Sendo assim, defendemos:
I. Garantia aos companheiros (as) de funcionários
públicos Federais e Estaduais homossexuais de
todos os benefícios previdenciários já
oferecidos aos companheiros (as) de funcionários
públicos Federais e Estaduais heterossexuais
pela legislação previdenciária.
II. Apoio à luta pela aprovação
do Projeto de Lei do Contrato de União Civil
Entre Pessoas do Mesmo Sexo.
III. Incorporação e aplicação
de programas de educação especializado
no ensino de 1º e 2º graus, respeitando a
livre orientação sexual.
IV. Incentivo a eventos socioculturais de temática
homossexual, dando apoio e tomando visíveis as
datas comemorativas das minorias sexuais buscando a
visibilidade.
V. Criação de programas específicos
de saúde que atendam à demanda em relação
ao segmento homossexual como:
a. Atendimento integral aos profissionais do sexo;
b. Atendimento que contemple as especifícidades
de travestis e transexuais;
c. Capacitação e treinamento permanentes
dos profissionais da área de saúde para
combater o preconceito e a discriminação
no atendimento de gays, lésbicas, travestis,
transexuais e profissionais do sexo, evitando o constrangimento
e a discriminação do doador de sangue
que mantenha relações sexuais com pessoas
do mesmo sexo;
d. Implementar programas de prevenção
das Doenças Sexuais Transmissíveis e AIDS/HIV
junto ao segmento homossexual;
e. Atendimento psicológico destinado aos familiares
de gays, travestis, lésbicas e transgêneros
de forma a serem esclarecidos sobre a questão
da homossexualidade como orientação e
não como desvio;
f. Garantir acesso gratuito e continuado pela Rede Pública
de Saúde da realização de cirurgia
para adequação de sexo para os/as transexuais;
g. Implementação de políticas públicas
que gerem empregos e renda para os homossexuais;
h. Constituição de um Comitê Assessor
composto por lideranças homossexuais e técnicos
no âmbito do Ministério da Justiça
para orientar e propor a implementação
de políticas públicas de afirmação
da cidadania homossexual;
i. Implementação pelo Governo Federal
das metas propostas no Programa Nacional de Direitos
Humanos em prol da cidadania homossexual.
Conclusão
Este conjunto de propostas não
encerra todas as nossas preocupações no
tocante aos compromissos dos futuros administradores
e legisladores de nosso País, mas é o
saldo de uma discussão amadurecida por estes
quase 25 anos de luta, e a postura das candidaturas
em todos os níveis frente a elas certamente influenciará
significativa parcela da sociedade brasileira, não
apenas de gays, lésbicas, travestis, transexuais
e bissexuais, mas de todas e todos que acreditam que
sem a superação da homofobia e da discriminação
jamais alcançaremos uma efetiva democracia no
Brasil.
ASSINAM ESTA PLATAFORMA
(em ordem alfabética)
1. Adé Fidan/Casa de Vivência
“Saara Santana” - Londrina - PR
2. AFAGHO Apoio a Familiares e Grupos Homossexuais Campinas
- SP
3. ANTRA Articulação Nacional de Transgêneros
4. Associação Amazonense de Gays, Lésbicas
e Travestis AAGLT - Manaus - AM
5. Associação Brasileira de Gays, Lésbicas
e Travestis ABGLT
6. Associação Garotos da Noite Profissionais
do Sexo Masculino - Manaus - AM
7. Associação Goiana de Gays, Lésbicas
e Travestis AGLT - Goiânia - GO
8. Associação Ipê Rosa GLSTB - Goiânia
- GO
9. Associação das Lésbicas de Minas
Gerais (ALEM) - Belo Horizonte - MG
10. Associação de Luta Pela Vida - Boa
Vista - RR
11. Associação da Parada do Orgulho de
Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros
de Brasília - DF
12. Associação da Parada do Orgulho de
Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros
de São Paulo - SP
13. Associação Princesa Conscientização
e Emancipação Homossexual - Manacapurú
- AM
14. Associação Sul-Brasileira de Gays,
Lésbicas e Travestis ASBRAGELT - Curitiba - PR
15. Associação das Travestis do Amazonas
ATRAAM - Manaus - AM
16. Associação das Travestis do Mato Grosso
do Sul - Campo Grande
17. Associação de Travestis e Transexuais
de Salvador ATRAS - BA
18. Atitude - Instituto Atitude - Direito e Cidadania
para Homossexuais - Brasília - DF
19. Atobá Movimento de Afirmação
Homossexual - Rio de Janeiro - RJ
20. Cellos/MG- Centro de Luta pela Livre Orientação
sexual - Belo Horizonte - MG
21. Clube Rainbow de Serviços - Belo Horizonte
- MG
22. Coletivo de Feministas Lésbicas - São
Paulo - SP
23. Coletivo de Lésbicas do Rio de Janeiro COLERJ
- RJ
24. CORSA Cidadania, Orgulho, Respeito, Solidariedade
e Amor - São Paulo - SP
25. E-jovem.com Grupo de Adolescentes Homossexuais -
Campinas - SP
26. Estruturação Grupo Homossexual de
Brasília - DF
27. G Magazine - São Paulo - SP
28. GDC (Grupo Diversidades de Conscientização
GLBT)
29. Gendercare.com - Gender Therapy Oníine
30. GLOS (Grupo de Livre Orientação Sexual)
- Caxias do Sul-RS
31. GrupoAMHOR - Recife - PE
32. Grupo Arco-Íris de Conscientização
Homossexual - Rio de Janeiro - RJ
33. Grupo Brasileiro de Disfóricos de Género
GBDG
34. Grupo Desobedeça GLBT - Porto Alegre - RS
35. Grupo Dignidade - Curitiba - PR
36. Grupo Esperança Construindo a Cidadania das
Travestis - Curitiba - PR
37. Grupo Felipa de Sousa - Rio de Janeiro - RJ
38. Grupo Gay de Alagoas - Maceió
39. Grupo Gay da Bahia - Salvador
40. Grupo Gay de Camaçari - BA
41. Grupo Lésbico da Bahia - Salvador
42. Grupo Hábeas Corpus Potiguar - Natal - RN
43. Grupo Leões do Norte - Recife - PE
44. Grupo Matizes - Teresina - PI
45. Grupo de Resistência Asa Branca - Fortaleza
- CE
46. Grupo Satyricon - Recife - PE
47. Identidade Grupo de Ação Pela Cidadania
Homossexual - Campinas - SP
48. Igualdade Associação das Travestis
e Transexuais do Estado do Rio
Grande do Sul - Porto Alegre
49. ILGLAW mtemational Lesbian and Gay Law Association/Brasil
50. Instituto Paranaense 28 de Junho - Curitiba PR
51. Movimento Contra a Homofobia - Uberaba - MG
52. Movimento Gay de Minas - Juiz de Fora - MG
53. Movimento pelo Espírito Lilás MEL
- João Pessoa - PB
54. Movimento Homossexual de Belém - PA
55. Movimento Lésbico de Campinas MO.LE.CA. -
Campinas - SP
56. Provida - Maceió - AL
57. Quimbanda Dudu Grupo Gay Negro da Bahia - Salvador
58. Rede de Informação Um Outro Olhar
- São Paulo - SP
59. Site Bybas.cjb.net - Campinas - SP
60. Site Namoro Gay Brasil - São Paulo - SP
61. SiteGLSPlanet.com
62. Site GLSSITE.Net
63. Sub-Comissão de Orientação
Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil - SP
64. Transgender Brasil- Associação Brasileira
de Portadores de Neurodiscordância de Gênero
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